Tuesday, July 19, 2016

Ilha da Boa Vista (Cabo verde) – mar atlântico e brisa tropical

As férias são sempre um tempo de bênção e de harmonia. Programar os tempos de descanso deve por isso ser um exercício que promova o bem-estar e o prazer da descoberta. A dimensão do mundo obriga a uma 
escolha criteriosa que passa pela definição de escolhas que façam sentido nas suas diversas facetas. São necessários ter em conta os recursos económicos, preocupações com a estabilidade política e a razão e a vontade de conhecer um determinado local. Esta pesquisa exige tempo e envolvimento o que, em conjunto com as atividades laborais, faz sentir por vezes, que é mais uma tarefa do que uma atividade que produza alguma distração e prazer. Outro aspeto interessante é que muitas vezes as pesquisas e as orientações que começam a ganhar forma em relação aos aspetos referidos anteriormente, chegando muitas vezes a fase detalhada de itinerário, com locais a visitar, estadias e preços, até ao orçamento final, acabam por não serem as eleitas para cumprir os tempos de férias. Este ano a nossa atenção concentrou-se inicialmente em Marrocos, país do qual apenas conhecemos a mágica cidade de Marraquexe, o achamos sempre místico e belo cheio de segredos para 
desvendar. O calor excessivo do verão e as longas distâncias que o percurso exigia, fizeram este destino ficar guardado como suporte para uma futura visita. Olhando para o mapa da Europa e já com um curto espaço de tempo até à data das férias, outras alternativas foram estudadas, desde a Roménia à Bulgária mas nenhuma delas ganhou força para ser eleita como destino de férias deste ano. Com as feiras de férias a decorrer, uma incursão aos diversos espaços serviram para organizar ideias, ver preços e comparar condições. Numa destas deslocações as condições e a relação qualidade-preço fez ganhar forma a possibilidade de conhecer uma das ilhas do arquipélago de Cabo Verde. Como os primeiros dias de férias foram previstos em formato de nada fazer, um pacote em regime de tudo incluído seria o desejável. Ouvidas as opiniões dos diversos operadores, a escolha recaiu sobre a ilha da Boa Vista, por ter melhor clima e praias mais tranquilas em relação à afamada ilha do Sal. A escolha não podia ter sido melhor. Rumamos a Cabo Verde num voo charter da companhia aérea Everjet, 
nome que me era familiar mas sem conseguir recordar a origem. Tentei tranquilizar a minha curiosidade tentado identificar a língua de algumas designações nas informações da cabine, mas sem sucesso. Ao lado da informação do exit, estava escrito Keluar. Sem o Google tradutor por perto e com uma semana repleta de belas experiências, a resposta a esta questão ficou para o voo de regresso. Esta dúvida só foi no voo de regresso, após uma semana de férias no hotel da cadeia Iberostar. Cabo Verde é um arquipélago constituído por 10 ilhas e foi descoberto em 1460 por navegadores portugueses. As primeiras ilhas a serem habitadas foram a ilha de Santiago e o Fogo. As origens das gentes deste belo país, foram o resultado do cruzamento entre os povos europeus e negros da costa africana. Desta mistura veio a originar-se uma nova cor de pele que no vocabulário comum se designa de “mestiça”. A posição estratégicas destas ilhas entre a Europa, África e América veio a fazer delas um grande entreposto para o comércio de escravos, situação que veio a contribuir para o seu desenvolvimento.
Dividido em capitanias, a mão-de-obra escrava vinda da vizinha Guiné ajudava no cultivo do algodão e da cana-de-açúcar, principais culturas que a ilha produzia e que serviam para a exportação. A colonização e povoamento foram muito lentos, pois não era fácil convencer os colonos portugueses a irem viver para as ilhas, devido aos rigores do clima que dificultavam o aproveitamento agrícola das ilhas. O povoamento fez-se por fases e hoje em 
dia é visível em cada ilha os traços da colonização. A presença inglesa em S. Vicente é visível no crioulo da ilha. Em Santo Antão e Fogo encontramos uma forte presença de portugueses, principalmente dos Açores e da Madeira, visível no tom de pele mas também em certas expressões. Cada ilha tem portanto as suas especificidades que merecem uma visita atenta para que se possa sentir a cultura e a história deste povo irmão, caloroso e afável, que vive e recebe com a mesma amenidade com que o clima os abençoa. A chegada ao aeroporto da Boa Vista faz-nos recordar o passado quando pisamos pela primeira vez solo caribenho. O clima quente de ar sereno, um aeroporto simples e desprovido da complexidade a que já nos habituamos em muito aeroportos de outros locais do mundo. Um simples edifício com uma porta de entrada e outra de saída, umas riscas no chão que guiam os passageiros durante o percurso na pista e tudo funciona bem sem outras 
preocupações. A receber-nos com um sorriso de boas vindas estava a representante local do grupo turístico. A viagem do aeroporto ao hotel é curta, com um percurso que se faz de autocarro através das poucas estradas com pavimento que a ilha tem. O contacto com a terra e a paisagem que nos envolve fez-nos sentir como tudo é simples e belo. A vida aqui tem outra velocidade e é fácil deixarmo-nos contaminar e envolver pela beleza da paisagem, apesar de árida e monocromática. A cor predominante é o castanha/ocre apenas interrompida por uma ou outra pintura de casas semiacabadas, mais ousada, podendo ser um verde forte ou um vermelho que focaliza a nossa atenção. O hotel situa-se na zona este da ilha em cima de uma arriba aparentemente de arenitos consolidados, sobre a maravilhosa praia de chaves. O funcionamento do resort é o habitual neste tipo de condições. Os quartos encontram-se organizados em forma de casas individuais formando pequenos aglomerados com ruas, jardins tropicais onde não faltam os coqueiros, mas também gatos e até cabras que se passeiam livremente por entre as várias pracetas. Do topo da arriba quer se esteja a usufruir de um refrescante 
banho de piscina ou a saborear um café, a paisagem é paradisíaca. A visão é de quase 180º, tendo para a esquerda o complexo dunar qual deserto abraçado pelo mar de um azul/esverdeado e transparente. Na frente do hotel encontra-se a zona reservada os clientes com espreguiçadeiras e chapéus de palhota, onde quem procura este local pode recuperar forças deixando-se estar a ver ou ouvir o mar, a ler ou a dar ordem ao cérebro. Para o lado direito do nosso olhar a praia estende-se até desaparecer na curva de uma duna que limita a continuação do areal fazendo antever a sua continuação quase até à capital da ilha que é Sal Rei. A praia de chaves é de facto a mais bela praia de toda a ilha. A areia parece vinda do deserto e o mar, que não é parado, tem uma cor que convida a entrar e a disfrutar da sua transparência.  Os dias perderam-se entre caminhadas, exploração das 
dunas e banhos que apeteciam nunca terminar. O por do sol, o clima, a vegetação, a tez e a simpatias do povo, em tudo faz lembrar as caraíbas embora estivéssemos em mar atlântico abençoado por uma brisa tropical. Durante alguns dias o tempo esteve encoberto e ventoso, situação habitual por estas paragens. A temperatura da água não sofria por isso qualquer desvio térmico convidando sempre a entrar e a estar. Voltando ao assunto da origem da companhia aérea, a resposta foi agora desvendada numa breve conversa com uma das assistentes de bordo. A Everjets é uma companhia que já existe fazendo negócio na aviação privada. É portuguesa e pertence ao grupo Air Horizon (te) com sede em Saragoza e tem base no norte do país, no aeroporto do Porto. Opera desde à cerca de 4 anos voos charter com operadores turísticos. O avião em causa é recém-chegado de uma região, sem que as assistentes de bordo soubessem bem de onde, Indonésia e Argélia foram as opções apontadas. O termo Keluar (saída/exit) parece ser em língua Malaia. Fique apreensivo com estas informações principalmente sobre a origem do avião, pois a Indonésia tem as piores companhias aéreas do globo. Tratando-
se de um boing 737-400 a esperança é de que a manutenção estivesse a cargo da companhia agora detentora do aparelho com regras de segurança europeias. De volta à ilha…numa das manhãs optamos por fazer um dos passeios proposto pela operadora local.  Existem várias opções para quem quer sair do formato dos banhos e do sol. É uma forma de conhecer um pouco da terra, ver outras paisagens e contactar de perto com a realidade dos habitantes. A saída foi em pick-ups de caixa aberta com lugares atrás. Só a ideia alimentava a alegria de ir de em contacto com a brisa quente, por entre estradas sem asfalto com nuvens de pó. O percurso incluía uma paragem obrigatória na localidade de Rabil, onde se encontra a escola de olaria mais famosa da ilha onde ainda tudo é de fabrico artesanal. Rabil é uma aldeia de construções que fazem lembrar que estamos em África, embora o oceano nos separe cerca de 450 km. Casas humildes, a maioria sem pintura, outras por acabar, sem qualquer ordenamento. Para o padrão de alguém oriundo de outra zona mais desenvolvida do mundo, a ideia com que fica deste enquadramento é a de pobreza e para alguns talvez mesmo a miséria. Para mim existem 
diferenças significativas entre estes dois conceitos, sendo a pobreza um termo mais lato. Como conheço alguns, ainda que poucos, países africanos, a forma como interpreto esta forma de estar é meramente a da adaptação aos padrões locais. Não considero que as gentes que vi sejam consideradas pobres. Serão pobres para os referenciais de um cidadão Europeu, Australiano ou Americano. São pessoas de aparência simples, humildes, educadas, bem trajadas que vivem a vida com muito menos que nós mas que para o local onde habitam têm o suficiente para ter uma vida com dignidade. Claro que existem limitações nestes locais mas estas limitações são mais sentidas por que visita estas regiões. É o acesso ao consumo e à publicidade que promove a necessidade de consumir produtos e alguns artigos. Lembro-me de um colaborador do hotel me 
questionar sobre o preço do meu selfie stick, quando o coloquei em cima do balcão do bar para segurar num magnífico mojito. Ele sentia aquela necessidade por já ter visto e por não existir à vendo no país mas vive muito bem sem aquele objeto. A ilha da Boa Vista tem cerca de 16 mil habitantes sendo que cerca apenas cerca de 2000 são nativos da ilha sendo os outros cidadãos de outras ilhas que vivem nesta ilha para trabalhar. A maioria da população subsiste da agricultura, pastorícia e da pesca. Nos resorts turísticos trabalham essencialmente os que vêm de fora para procurar emprego nesta que é uma das ilhas com melhores praias do arquipélago. De cara ao vento nas nossas pick-ups percorremos o caminho até deserto de Viana onde nos esperava mais adrenalina. A ideia era entrar no deserto com as carrinhas com a tração ligada a percorrer as dunas em velocidade que 
permitisse alguma emoção. E assim foi! O deserto de Viana tem uma extensão de cerca de 6000 km quadrados e permite viver sensações idênticas às que se podem experimentar noutros desertos do mundo, nomeadamente pisar a areias de granulometria fina e suave, aproveitar as encostas e os vales para rebolar ou simplesmente ficar deitado a olhar o céu. Este estreito contacto só é interrompido pelos gritos de emoção dos mais audazes que libertam a sua alegria dando ideias inspiradoras aos menos expansivos. É em plena areia do deserto que também se fazem compras e negócios com os vendedores de quadros e estatuetas africanas. Regatear é a palavra de ordem, e sabe tão bem, de joelhos sobre a areia do deserto, regatear com gente humilde e simpática 
que ganha a vida de uma forma única. Depois desta sensação de dimensão do tamanhão do deserto, dirigimo-nos para a praia onde se encontra um barco encalhado à quase 50 anos. Parece ter sido o forte magnetismo da ilha, fruto da sua constituição mineralógica, a responsável por este naufrágio. O barco encontra-se corroído pelo desgaste imposto pela maresia e é uma das grandes atrações da ilha. O nosso passeio terminou na capital da ilha, Sal Rei, onde tivemos tempo de contactar um pouco com o comércio local, comprar algumas recordações e fotografar alguns aspetos com a igreja, o minarete da praça central e a magnífica baia de águas calmas, domesticadas pelo ilhéu em frente. Desta forma os dias passam ao sabor do tempo, mais rápidos que o nosso 
desejo, fazendo aproximar-nos dos nossos próximos dias de férias que foram planeados para serem bem diferentes e aventureiros. Passamos do formato em que tudo foi pensado e planeado, onde o único trabalho exigido era decidir entre o sol ou a sombra, qual o próximo cocktail, ou que petiscos experimentar em cada refeição, para dias em que utilizar o cérebro era tarefa obrigatória, pois espera-nos um país distante, complexo, burocrático e hermético onde a língua é obtusa e o entendimento praticamente impossível. Visitar a Rússia tem destas coisas. Foi um destino que surgiu nas nossas pesquisas um pouco por acaso, embora a vontade de partir para terras soviética fosse uma enorme vontade. Estamos algo apreensivos mas não nos deixamos derrubar pela dificuldade. Afinal a vida tem mais sabor quando somos postos à prova e nos deparamos com situações que exigem estratégia para as resolver. Disso darei conta no próximo post sobre a nossa viagem a Moscovo e a Saint Pertersburg.

Os dias no resort na ilha da Boa Vista passaram-se entre o sol e algum vento, tentando provar todos os cocktails do menu. O restaurante servia uma gastronomia magnífica, muito cuidada e diversificada e as noites eram animadas por um brilhante grupo de animadores que estavam presentes ao longo do dia para entreter quem quisesse sair do modo da cristalização cerebral muitas vezes necessária para equilibrar o intenso desgaste imposto pelas atividades laborais. Levamos no banco das nossas memórias a avassaladora paisagem desta praia de areias finas e águas cristalinas emoldurada por dunas de areias dinâmicas trazendo a sensação do deserto para junto da costa. O calor humano deste povo, a sua proximidade, humildade e gentileza faz-nos 
ainda acreditar que a humanidade continua a ter enorme valor como espécie soberana numa altura em que o mundo é ameaçado por um grupo de gente fanática que destrói, semeia o medo, o sofrimento e a morte como forma única de expressar os seus desvios comportamentais. Certamente que os responsáveis pela criação destas perturbações em muitos dos jovens que integram estes grupos assassinos, foram outros grupos de indivíduos de carácter maquiavélico e de interesses egoísticos e perturbadores.

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