Tuesday, November 10, 2015

O luxo entre a planície e as estrelas

No meio de uma herdade, a Herdade do vale das Sobreiras, para os lados de Mosqueirões na zona de Grândola,  ergue-se desde o dia 31 de julho um 
projeto que reflecte a coragem, o sonho e a audácia de um casal de arquitectos. Tudo nasceu um pouco fruto do acaso. A família numerosa e proprietária do terreno, projectava para este local algo para que os descendentes pudessem usufruir.  Na casa de férias do casal, próximo do local onde agora se encontra o Sobreiras Alentejo Country hotel, hoje uma Guesthouse com  partilha de alguns serviços com o hotel, surgiu então a ideia arrojada de se erguer um complexo turístico. Ideia concebida e a 
vontade natural que reina nos espíritos dos arquitectos de deitarem mãos à obra e fazerem nascer criações, o projeto passou rapidamente do plano do pensamento para o esboço elaborado. Neste esboço foram projectadas ideias claras, fazendo respeitar a morfologia do terreno, o enquadramento paisagístico e o respeito absoluto pelos residentes principais deste local, os sobreiros. O projecto desenvolveu-se numa linha idealizada no local onde esta espécie deixou alguma abertura. 
O projecto teria que se encaixar na zona sem ofender ou abater qualquer sobreiro. Este principio foi seguido com respeito absoluto, tal como foi respeitado o terreno de implantação do hotel que se ergueu sem violar as linhas topográficas do terreno. Foi a obra que se adaptou ao terreno e não o contrário. Essa adaptação é visível pelas fundações que estão ao ar livre por baixo das casas que agora albergam os quartos e os espaços comuns. Estas breves explicações das história do complexo e destas características 
técnicas e ecológicas foram-me transmitidas pelo gerente do hotel, O sr. Pedro Manso, com quem tive o privilégio de estar à conversa logo à chegada. Para se chegar ao hotel, a cerca de 1 hora de Lisboa, percorre-se a estrada nacional que une Lisboa ao Algarve. As pesquisas prévias que fiz no sentido de me perder menos, não deram grande resultado porque a placa com o nome da localidade de Mosqueirões, não cheguei a encontrar. Aqui funciona a procura e o esclarecimento junto dos residentes locais. É o 
que dá prazer a estas nossas curtas escapadinhas cumprido a máxima do turismo nacional do “vá para fora cá dentro”. Depois de avançar um pouco para além de Grândola para provar o património gastronómico de canal Caveira, foi necessário voltar atrás e procurar a 2ª saída de Grândola, com a indicação do hospital e nessa mesma direcção mas na faixa contrária estaria a saída para o hotel. Depois desta saída que está assinalada com a placa de hotel, alguns metros à frente, vira-se à esquerda e segue-se 
uma estrada secundária rodeada de bela vegetação, durante cerca de 7 km. A entrada para o hotel encontra-se de novo assinalada do lado esquerdo. Desta indicação até ao complexo percorre-se uma curta estrada de terra. O alinhamento de casas brancas no topo de um discreto planalto não nos deixa enganar e convida-nos a explorar a ideia que nasceu nas cabeças do casal proprietário. A estrutura central onde são os serviços comuns encontra-se ladeada à esquerda e à direita de casas 
brancas com arquitectura geminada em bolos de 4 ou 5 casas como se de um pequeno aldeamento se tratasse. Não há telhas no topo do telhados nem barras coloridas em volta das portas ou janelas, apenas casas brancas com arquitectura de linhas direitas e tecto em V. Na receção encontrei o Pedro actual director do hotel mas também recepcionista. Para muito este facto pode parecer estranho. Estamos todos, nos dias que correm, habituados, eu diria mais, formatados para condutas e 
comportamentos normativos. Para a maioria de nós seria impensável aceitar que um director de hotel pudesse estar a fazer check-ins. Mas a realidade para a qual temos que estar despertos para interpretar, diz-nos que as normas necessitam de ajustamentos que façam sentido. O hotel que aqui caracterizo é um pequeno paraíso idealizado e tornado realidade pelo esforço dos seus mentores. É uma dádiva de bom gosto e de beleza plantada no meio da natureza. Para que seja viável e sustentável 
precisa de uma política de gestão estruturada à dimensão do projecto sem beliscar a qualidade e o conforto. O Pedro, homem de tracto fácil, educado e bom falante é o exemplo do homem certo no local adequado. Falou-nos do seu percurso profissional e dos muitos desafios a que já respondeu. Este é mais um no seu vasto curriculum. Conseguiu reunir pessoas da região com gosto pelo desafio e com vontade de aprender e de crescer. Ao seu lado estavam a Liliana e o Mário de quem teceu os 
maiores elogios pelo seu esforço e dedicação. Neste ambiente de calor humano sentimo-nos como se estivéssemos em casa entre amigos. O quarto 14 que nos esperava alcançava-se percorrendo um pequeno trilho em tijoleira, traçado junto às casas. Quando contactamos pela primeira vez com algum ambiente que ainda nos é desconhecido, reina em nós a ânsia da descoberta, da apreciação o pormenor, a procura da novidade. Para lá da porta branca estaria um 
aposento, projectado por alguém, de certeza que com a intenção de nos 
surpreender. A surpresa teve inicio logo com a geometria do espaço. Cada casa construída é um quarto, eu diria um quarto com dimensão de uma suite. As mesmas linhas sóbrias do exterior foram conservadas no interior dos alojamentos. Linhas direitas, geometria e neutralidade. O quarto desenha-se com um rectângulo que comporta outro rectângulo de menos dimensão onde está inserida a zona de wc e banho e que é separado do quarto apenas com uma parede. Este compartimento do 
wc tem um tecto que faz com o tecto do quarto um ângulo de 90º de onde sai uma luz diferida que complementa toda a estrutura de iluminação do espaço. A parede adjacente à porta tem portas em vidro de cima a baixo que permitem que a paisagem exterior funcione como uma tela viva dentro do espaço. A varanda que é o prolongamento do rectângulo apenas se diferencia pelo vidro que a separa do espaço interior e é ornamentada na sua parede externa por troncos (barrotes) de madeira a distâncias calculadas 
uns dos outros, trazendo para o conjunto as características bucólicas do local. A decoração interior é simples mas mostra personalidade pelo bom gosto, pelo design e pelo conforto. Os tons predominantes são as da madeira e da cortiça. Reinas de forma discreta os castanhos claros e nada mais. Tudo é minimalista, claro e clean diria eu. O pavimento é todo ele em cortiça a recordar-nos que estamos no meio de uma herdade de sobreiros. As mesas-de-cabeceira e a mesa de apoio do espaço exterior não 
são mais do que troncos de sobreiros, “descascados”. Apreciada este nossa casa na herdade, era tempo de ir à descoberta dos espaços comuns. A apetecível piscina qual tela desenhada a cortar o verde da paisagem com o seu azul marinho, ali estava convidando a um mergulho na sua água fresca temperada pela humidade da noite. As sobreiras próximas miravam-se no espelho de água refletido pelo sol, ajeitando as suas 
folhas e os seus cachos de bolotas. O som da água a escorrer pela encosta 
da piscina, juntamente com o chilrear dos pássaros e os chocalhos são os únicos sons que nos fazem dispersar deste deslumbramento. As fachadas traseiras dos edifícios são todas forradas com troncos de madeira que acompanham a estrutura e as linhas de todas as estruturas de betão. Os troncos estão separados a distâncias iguais cortando a cor branca do conjunto e reforçando os traços campestres que unem a construção à paisagem do montado que a rodeia. A zona da receção continua-se por uma sala repleta 
de cadeirões todos com padrões e texturas diferentes mas que em conjunto lançam traços de harmonia que se continuam com os padrões dos tapetes e dos elementos decorativos que adornam os móveis. Este espaço encontra-se dividido por uma lareira que se suspende do tecto e dá continuidade a outro espaço onde se pode ver televisão,  consultar a net ou simplesmente ler um livro. A sala de refeições é de dimensões menores e está decorada com mesas de madeira e cadeiras pretas num contraste delicioso que inspira decoradores e projetistas. Neste conjunto de harmonia de padrões, texturas e contrastes vivem-se horas de plena paz onde é possível ouvir o silêncio, cheirar os aromas do campo, ouvir os sons da natureza e 
deixar o tempo passar dando-lhe qualidade e beleza. Como somos uns aficionados da gastronomia local pedimos ao Pedro algumas orientações para provar as iguarias da região em ambiente informal. Foi-nos sugerido o restaurante a talha junto ao largo das Palmeiras, logo numa rua atrás dos bombeiros. No caminho fomos atraídos por um grelhador onde assavam numas brasas incandescentes, enorme pimentos. A 
ementa deste local, a tasca do Zé da Moura era atractiva e muito convidativa. Apenas para cumprir a formalidade, fomos espreitar o restaurante recomendado mas a atração pelo grelhador fez-nos inverter o caminho e jantar num local fantástico, genuino, com gente simples e de uma enorme simpatia. A escolha foi fácil e a apresentação dos pratos surpreendeu. Enquanto esperávamos tive oportunidade de explorar o espaço que mostra paredes pintadas com cores fortes em vermelho e azul, peças de barro características do alentejo e alguns cartazes alusivos a 
grupos desportivos e de ciclistas. Em destaque estava uma foto do grande Zeca Afonso. Como decorria nessa noite a nona edição da festa do chocolate, reservamos a sobremesa para escolher entre as muitas opções deste local de perdição gastronómica. Sem fugir ao ingrediente rei da festa, o chocolate, a escolha era variada. Desde enormes suspiros a queijadas de bata doce, pão de chocolate, pizzas de chocolate com frutas diversas, 
cerveja de chocolate ou espetadas de morango com chocolate acabadas de fazer. o Quiosque do hidromel era uma tentação para os sentidos pois desde licor a trufas com hidromel e gengibre em chocolate de leite ou negro, a escolha era variada e difícil. Depois deste percurso tentador esperava-nos o magnífico descanso no hotel mais simpático e confortável que uma herdade nos pode proporcionar.

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